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Psicólogos também sofrem com consultórios cheios de “traumas”

Durante esse mais de um ano após o início da pandemia, as pessoas se viram em vários estágios emocionais. Há quem tenha sofrido logo no início e foi melhorando ao longo do tempo, tem aquele que só sentiu os reflexos psicológicos tardiamente, tem que não saiu do buraco e tem, raríssimos casos, pessoas que nem tenham sofrido.

Independente do perfil, uma coisa é certa, nunca os consultórios de psicoterapia foram tão procurados, o que impôs um desafio aos profissionais: o de ajudar um terceiro ao preservando sua própria saúde mental.

Segundo a presidente do Conselho Regional de Psicologia de MS, Marilene Kovalski, a demanda vem por conflitos já existentes ou agravados pela pandemia. “Sintoma como estresse e cansaço emocional, irritabilidade, insônia, ansiedade, depressão, falta de concentração e produtividade são os mais frequentes”.

A percepção dos profissionais não necessariamente se confirma quando essa realidade é confrontada com o publico em geral. A enquete dessa semana, do Lado B, por exemplo, mostrou isso.

A pegunta feita: "A pandemia te levou para a terapia?" teve como resposta 79% "não" e apenas 21% "sim".

De acordo com a especialista, a pandemia trouxe a impossibilidade das relações sociais, problemas econômicos, desemprego, e luto diante de perdas de familiares e amigos. “As famílias foram afetadas com crianças e adolescentes fora da escola, o trabalho remoto acontecendo em casa, intensificando conflitos de toda ordem”.

Nesse contexto, os profissionais que atuam em saúde mental também foram afetados pela pandemia. Esse real, desconhecido, sem respostas que submete todos à impotência, à angústia. Um mal-estar que acomete a todos indistintamente.

“O ser humano é um ser sociável, e sofre com as restrições impostas pela doença, pelas autoridades sanitárias e governamentais. Impossibilita estar em festas, casamentos, aniversários, formaturas, shows, viagens etc. Enfim muita coisa ficou de fora, provocando frustrações, por um tempo já demasiado longo”.

Essa também é a percepção da pisicóloga Raissa Ramos Ferreira Pedroli. “O profissional, como qualquer outro indivíduo, precisa estar atento às suas próprias questões emocionais, também precisa buscar ajuda e tratamento, bem como estar em dia com sua saúde mental, para conseguir auxiliar as pessoas que lhe procuram. Profissionalmente pode ser desafiador lidar com uma demanda que é do outro, mas que também é do profissional, que está tão inserido na pandemia quanto o paciente”.

Pricila Pesqueira de Souza atende em Dourados. Na percepção dela, o brasileiro sofre mais. “A subjetividade das pessoas nunca está desenlaçada dos acontecimentos vividos no que diz respeito a segurança na saúde, na economia, etc. No Brasil, vivemos uma insegurança maior, um descaso profundo com a vida. Isso tem efeitos sobre as pessoas. Elas adoecem”.

A análise, para Pricila, ou psicoterapia pessoal é indispensável para todo psicoterapeuta. Independente da pandemia. Ela explica que não é possível sustentar uma escuta qualificada do paciente sem tratar das próprias dores. Essa é uma questão ética muito séria. Um psicoterapeuta não pode se autorizar se ele mesmo não estiver levando a sério seu tratamento. A pandemia, então, só ressalta que um psicoterapeuta não pode escutar seus pacientes sem ter falado exaustivamente e elaborado minimamente suas próprias questões.

“Eu considero que podemos chamar a pandemia de traumática. Traumática porque nos coloca cara a cara com a morte, com a incerteza, com o não saber sobre como cada corpo reage, com a não garantia de que teremos atendimento, também com a impossibilidade de enterrar os mortos seguindo os ritos necessários para a elaboração do luto. Dito isso, a angústia diante do trauma aparece como pânico, como depressão, como insônia, como desesperança. 

Por Lucas Mamédio – CREDITO: CAMPO GRANDE NEWS